Insónias e devaneios
Tenho-te a agradecer a surpresa e toda essa irreverência. Tenho-te a agradecer a tua existência, apesar de tudo. Pensei que não viesses, que não fosse saber de ti tão cedo. A minha vontade de falar era inquestionável, mas o desejo de suportar a tua ausência uma vez na vida desta relação era maior. Eu precisava da tua inexistência, eu precisava de não insistir. Eu precisava do pedaço de ti a que nunca tive direito. Eu precisava de ti por inteiro. E isso matou-me por dentro. Deixou-me em pedaços. Estilhaçou-me. E pior, refletiu-se por fora.
Veio a pouca vontade de falar, a pouca vontade de comer, a pouca vontade de me mexer, mas veio também a energia incontrolável do nervoso de não saber de ti... E de não saberes de mim; de não me procurares. Veio aquela luta inconsciente do cérebro e do coração, de ele dizer sim, e da cabeça dizer não. E a cabeça estava tão certa... Mas o coração é tão mais insistente... Desta vez perdeu. Eu sabia que o silêncio ia doer, eu sabia que querer controlar-me ia ser talvez dos meus maiores desafios e o pior de tudo era do cimo do mastro não ver terra à vista... Nem ter GPS para prever quando a começaria a avistar.
Eu sabia que provavelmente, mais cedo ou mais tarde, ia falhar e ceder. Ceder-te. Ceder-me. A ti. Sabia que a minha boca se abriria inevitavelmente. Só não sabia quando ou como. Juro-te que rezei quase todo o dia para me surpreenderes e me dares sinal de vida, mesmo achando quase impossível que o fizesses. Lembro-me de esperar acordada por isso e de acordar sobressaltada por te poder poder ter perdido. E de ter pensado que era um sonho quando te vi, de quase tão impossível que era e tão arrasada que estava: de sono, da falta de ti, do nervoso da tua ausência. A verdade é que adormeci meia acordada, abrindo de vez em quando os olhos que ainda seriam teus, e procurado um rasto teu... Por mais ínfimo que fosse. Não me foi difícil perceber-te e aperceber-me de ti. Mas foi-me difícil ceder-te. "Vá lá, desta vez foste forte"...terei sido?
A persistência merece o seu mérito. A resistência acabou por ser qualidade. Mas e depois?