Cidade.
Segredei à cidade
o meu desejo de te ver,
o meu desejo de te ter,
de saber por onde andas,
de acalmar esta ansiedade.
Segredei bem baixinho,
com vontade de desvendar
os sonhos que tenho por contar,
os pesadelos que tanto quero esquecer
e deixar ir devagarinho.
Segredei quase silenciosamente,
como quem não quer perturbar,
como quem não quer acordar,
o mundo que ainda dorme
e pensa conhecer-me perfeitamente.
Segredei à cidade
todos os momentos prometidos,
todos os momentos tão vividos,
e os que ficaram por passar,
recordando-os com claridade.
As luzes da cidade piscaram,
talvez a dizer que perceberam,
talvez a dizer que me ouviram,
talvez só porque sim,
sem saberem dos segredos que lhe contaram.
Os carros da cidade desapareceram,
deixaram de correr,
deixaram de se ver,
as ruas ficaram desertas,
sem as palavras que não se disseram.
Segredei à cidade
tudo o que ficou por acontecer,
tudo o que ficou por dizer,
como quem tanto quer paz,
como quem só quer felicidade.
Segredei à cidade minha
tudo o que de ti visitei,
cada beijo que troquei,
em como te dei o que era meu,
em como te entreguei o que não tinha.
Segredei à cidade,
sem qualquer esperança,
coração de insegurança,
olhar cheio de sonhos,
e alma cheia de vontade.
Segredei sem parar
à cidade partilhada,
à cidade tão explorada
como cada canto teu,
cada traço desse olhar.
Não quis esconder nada,
à cidade que era tudo,
à cidade que era um mundo
à cidade que conhecia
toda a história encantada.
Segredei à cidade tua,
que não sei,
não conheço a lei
de amores perdidos
desfeitos à luz da lua.
E eu pensei num final bem credível,
não fosse alguém reparar,
não fosse alguém querer acreditar
na descrição tão real
de um sonho quase impossível.
Inventei um final feliz,
que gostava de ter tido
que me haviam prometido,
final de seres tão meu,
final que sempre quis.
Não sei se a cidade me ouviu,
de tão baixo que falei,
de tão alto que calei
as lágrimas que falaram
de um futuro que fugiu.
Aquela cidade ficou lá
e eu decidi vir embora,
eu que sempre fui de fora,
que a assumi minha por ti,
pedi-lhe para te trazer para cá.
Segredei à tua cidade
o meu desejo de viver,
o meu desejo de me ter,
de poder fazer tudo sem ti,
e aprender a calar a saudade.