No nosso finalmente, No nosso pronto, No nosso agora, No nosso por aí fora, No nosso “não vejo a hora”, No nosso “de hoje em ora” Porque o nosso tempo demora.
Mas depois chega, e corre. Chega e não para. Chega e escorre, Chega e não espera.
E eu quero parar esse tempo quando ele chega, porque parece com tanta pressa, e vem e vai tão depressa. Esse tempo que não espera quando nos perdemos dele, quando nos perdemos dum mundo. Que tanto nos desespera.
E esse tempo acelera (mesmo a fundo) Quando somos um e o outro,
Quando somos um do outro, Quando finalmente estamos sós, Quando, por fim, nos temos, A nós e aos nossos momentos, E à nossa voz. E nos encontramos nos nossos beijos, nas nossas mãos, nos nossos nós.
E eu vejo um tempo que reage, A esse abraço que me derrete, A esse colo que me protege, A esse todo que, sem saber, me dás.
E depois há esse sonho de sorriso que me aquece, Esse “tu” que me prende, me apetece, Esse olhar que quanto mais olho, Mais sinto, mais vivo, mais tenho… Mais devaneio ou miragem me parece.
E o tempo não nos respeita, Nem a mim, nem a ti, nem a nada: Nem a essas coisas que são tuas, Nem a essas coisas agora tão minhas, Nem a esses momentos tão nossos, Tão escassos, Tão demorados, Tão apressados, Tão tanto, Tão tudo.
Eu escolho ser. Escolho sorrir, sonhar, voar, escolho muito viver - viver tanto, viver tudo, ver o mundo.
Escolho os verbos bons, Não os de bom tom, Mas os inteiros, completos, repletos, que marcam a vida, que marcam a alma. Os que deixam o mundo menos feio, e me deixam de coração cheio.
Escolho-me a mim e às opções fáceis: fáceis de lembrar, fáceis de querer para sempre, fáceis de fazer levitar.
Acreditar.
Escolho os arrepios na espinha e as lágrimas do não correspondido, Em vez do que não vi, não foi, não houve, do que nunca seria vivido. Porque prefiro essas sensações, emoções, mesmo que incluam ilusões, frustrações, deceções, desilusões.
E que tudo em mim vibre, Tudo em mim deseje, Tudo em mim brilhe, e ria, e viva.
Ai a vida! Boa vida, Tão bela de ser vivida.
E que eu guarde em mim os sonhos todos do mundo, Lá bem de cima, Lá bem do topo, Até ao meu eu mais profundo.
Que eu viva bem, esse fogo que arde e ninguém vê, sem almas pequenas, sem corações de pedra, sem perder tempo, sem me apressar. E a acreditar...
Sempre a acreditar.
Respira: Inspira, Suspira Expira... Explode! Acredita E não pira!
E que eu beije, eu veja, eu sinta, eu tenha, eu seja.
Que eu seja tão eu, que não saiba se vivo ou se sonho. E que me escolha sempre a mim, ao meu início, ao meu meio ao meu eu inteiro, ao meu fim.
Vais voltar? Se disseres que sim, eu espero. Se disseres que vens, eu fico. Se disseres que queres, eu quero. E prometo que te deixo a porta aberta.
Deixo-te a porta escancarada, Para que chegues sem entraves, Para que chegues sem demoras, Para que venhas sem desculpas, Sem perguntas, Só respostas.
Até estendo passadeira vermelha, (Ou azul, se preferires), Para que saibas a direção, Para que tenhas a certeza de que te quero aqui, Para que regresses sem hesitação, Sem qualquer dúvida da minha vontade. e que nunca te diria que não.
Como diria?
Só não me peças que seja eu, por favor. Não peças que seja eu a ir, Não ponhas esse passo em mim, Que não fui eu quem fugiu, Não fui eu quem desistiu Não fui eu que pedi o fim. Por minha vontade ficávamos e seríamos, Mas tu foste, mesmo assim.
Mas ainda acredito, sabes? E ainda quero que voltes.
Voltas?
Se voltares, eu recebo-te. Recebo-te de alma e coração, Recebo-te de braços abertos, De regaço disponível, De olhos brilhantes, E o todo mais que for possível.
E até posso ir contigo depois: A sério que vou! (como sempre fui) Mas só depois de vires tu.
Vens?
Tens a porta aberta, Entrada mais que disponível, Para que saibas que podes mesmo voltar, Para que possas vir e não querer ir mais, Para que possas vir, rir, entrar e ficar.
Não garanto esperar para sempre, O tempo urge, A vida voa, O futuro ecoa, As coisas mudam de repente, E eu não sou assim tão paciente.
Mas, para já, ainda quero. (Quero muito.) E garanto que ainda te espero, E até prometo que me esmero, para não voltarmos a ir.
Subi as escadinhas que davam até à tua porta e toquei à campainha como se fosse a primeira vez.
Era inevitável não me arrepiar ao chegar ali e em pensar em todas as hipóteses e histórias que se viveram e não poderiam esperar do outro lado da porta... estarias como eu? Eu tremia por dentro, vibrava de vontade de te abraçar, tinha o coração a mil com toda a conversa que nos levou até este ponto, tinha um aperto no peito com a possibilidade de estares a precisar tanto de mim como eu de ti, naquele instante.
Abriste a porta e olhámo-nos de alto a baixo como se fosse a primeira vez que nos víamos – talvez fosse a primeira vez que alguém realmente nos via em muito tempo. Segui-te como se estivesse nos corredores de um museu, um caminho que parecia um labirinto, entre umas paredes que se sentiam demasiado estreitas para a tensão e ansiedade que estava a gritar dentro de mim. Deixei-te levares-me onde me querias, deixei-te guiares-me pelo espaço, como achavas melhor. A minha ignorância do que fazer contigo (connosco) era demasiada! E não estava a conseguir ignorar, de todo, a vontade de te agarrar, de te acalmar, de te encostar ao meu peito: sem prudência, sem jeito, sem trejeitos, sem medos, ou desconceitos, ou segundas intenções.
Cada passo que davas, puxava-me mais para ti e tu, aí do teu canto, se calhar nem percebias. Estarias como eu?
Era inevitável não gostar de toda aquela situação. De toda aquela história que estavamos a criar quase de repente, quase sem querer, como se fosse a primeira vez.
E, de repente, tu paraste e viraste-te para mim. Olhaste-me de alto a baixo e viste-me como se nunca ninguém me tivesse visto, como se eu fosse a única pessoa à face da terra, parecias estar a estudar cada um dos meus traços, dos meus cantos, parecias decorar cada um dos meus sinais. Arrepio na espinha. Senti-me como se me estivesses a criar à medida que os teus olhos percorriam cada milímetro meu e eu ia aparecendo diante de ti, despida de noções e teorias. Senti o meu corpo aparecer como nunca, e senti a minha alma derreter aos teus pés. Senti-me como se finalmente alguém me visse – alguém me quisesse ver. Arrepio na nuca. Estarias como eu?
Estendeste-me a mão, e a minha não se inibiu nem um pouco em aproveitar o embalo. Puxaste-me para ti, assim que os teus dedos sentiram os meus. Os nossos corpos esbarraram como se fosse a primeira vez e senti mais um arrepio em mim, que desta vez levou exatamente o mesmo percurso que os teus olhos tinham feito momentos antes. Agora sim, era inevitável não gostar de toda aquela situação... Sensação. Os meus sentidos cruzaram-se dentro de mim: euforia, harmonia, sinfonia, poesia. Vi o filme da minha vida diante dos meus olhos, naquele instante. Vi todo um futuro desenhado pela minha imaginação e adivinhei cada toque, cada carinho, cada palavra silenciosa que se seguiu. Estarias como eu?
Despedimo-nos da vida, da rotina e do dia. Despimo-nos de nós . Focámos no ninho que tinhamos encontrado um no outro - e não importava o tempo lá fora. Ouvia-se chuva, ouvia-se vento e trovoada: sentiamos sol, sentia-te Sol. Fogo. Escutámos silêncio, escutámo-nos no silêncio. Dançámos corredor fora: descoordenados, como quem não sabe dançar (e não faz ideia do que vai acontecer) mas tão sincronizados! Embebedámo-nos um no outro (um do outro). Mergulhei nesses olhos que pareciam ver-me por dentro, que pareciam querer ler-me por completo. Tropecei, quase sem querer em ti e aterrei, sem proteção, em tudo o que éramos naquele momento. Fechei os olhos e segui guiada pelo magia do inesperado.
Não sabia o que viria dali. Tu saberias? Terias estudado tudo, como me estudaste a aura?
Eu não fazia ideia... mas aquela dança desmedida de olhares, aquela sintonia de arrepios, aquela explosão de sentidos, auguravam tudo de bom.
Eu sabia que ia mergulhar novamente nesses teus dois pontos chocolate, que iria saborear de novo esse sorriso caramelo que tanta fome me dava, que ainda iria ver o meu corpo no teu a dar um nó - um nó cego, daqueles que custa a desapertar e que nunca ninguém iria ser capaz de explicar.
Eu sabia que todo este esforço iria trazer um bom prémio no final, todo este alvoroço traria o melhor resultado possível, toda esta tempestade traria a maior paz quando passasse. Seria impossível resistirmos, depois de tanto, ao abraço um do outro, aos sussurros e conchinhas, aos cheiros e toques, aos beijos e cuidados. Seria impossível não querermos repetir toda a ligação inegável, toda a paixão que nunca fora pronunciada, toda o fogo que nunca fora controlado, todo o orgulho que sentíamos um pelo outro. Nunca fora segredo, toda a cumplicidade.
Mas agora... agora tudo além estava pronto a ser desvendado, por fim. Nada nos pararia! O mundo começara a girar como nós desenhámos: a passadeira vermelha estava, finalmente, estendida para todos aqueles sentimentos oprimidos e a avenida aprumada para os medos sambarem para fora dali.
Bem vindos, de alma e coração, ao cliché do resto da vossa vida!
Os cientistas deveriam, com certeza, estudar como era possível toda esta química nunca ter dado em explosão. Nunca entrara: sempre a podemos controlar, sempre a soubemos resguardar. Sabíamos como a tratar com o jeitinho certo para ser tão nossa, e só nossa, mesmo que exibicionista.
Dentro do caos da vida e da rotina, dentro do caos da agitação e da ansiedade, dentro do caos de uma anarquia, virámos ponto de encontro. A sorte trouxe-te para mais perto, o destino fez-nos um do outro no momento certo - e eu sabia tão bem o nosso lugar, dentro de todo o caos! O mapa deste tesouro estava muito resolvido: eras centro, eras serenidade, eras ponderação e proximidade.
Nunca fomos urgência, nunca fomos imediato ou promessa. Nunca fomos simulação ou concretude. Éramos segurança e descanso, desejo e amparo. Encontrávamos um no outro um ar mais respirável e uma força que tornava tudo fácil. Encontrámo-nos um no outro, com a tranquilidade de quem sabe que a pressa não traz perfeição: e nós éramos perfeição ideal, dentro de todos esses caos. Nós ficámos um do outro sem deixar de ser de nós, nós ficámos todo um mundo com todo o tempo para se fazer descobrir.
Sabíamos que a vida é curta de mais para ficar a pensar , para perder tempo e, talvez por isso, nos tenhamos encontrado finalmente, depois de tanto nos vermos. Vimo-nos diferente, depois de pousarmos um no outro, depois de nos encontrarmos. Aterramos um no outro, novamente e no nosso nada caos, com todo o caos em volta: eu sabia que voltarias - e eu não precisava de ti, não precisava desse teu jeito ou de toda a paz que me trazias, nem te ia pedir para ficares para sempre, mas esperava que o quisesses tanto quanto eu. Dava tempo para isso - ainda dava tempo para ficarmos um no outro para sempre.
Dentro de todo este caos de estar sem ti, eu sabia que virias. Dentro de todo este caos, que era ter-te sem nos ter, eu sabia que te teria. Dentro de todo este caos de não saber como nos querer, eu sabia que nos queria. Eu sabia que voltarias.
Sendo ela o teu horizonte e a primeira coisa que a tua vista alcança quando olhas da tua janela. É nela que os teus olhos pousam quando te distrais (ou será ela que te distrai quando os teus olhos se cruzam com ela?), deixaste-te enterrar nela, deixa-la envolver-se em ti. Deixa-la cruzar no teu caminho, acompanhar-te numa caminhada tantas mais vezes que eu!
E as vezes que deitas a tua cabeça nela em vez de a deitares em mim?
Quantas vezes a areia dessa praia já te abraçou e colou a ti... quantas vezes já sentiu o calor do teu corpo? Quantas vezes essas ondas já encontraram o teu peito... já se encontraram no teu abraço? Quantas vezes essa espuma beijou a tua pele?
E logo eu que gosto tanto de praia, fui assolada por este ciúme da tua praia. Só imagino as vezes que já te perdeste por aí, as vezes que já te despiste para ela... Torna-se difícil não invejar a sorte dessa paisagem, que já te teve como parte integrante e eu nem hipótese de admirar esse momento tive. Torna-se difícil resistir a um ciúme louco de imaginar que te toca mais vezes que eu. Torna-se impossível não desejar loucamente ser essa praia, ou ter, pelo menos, um pouco da sua sorte.
A sorte de ver esse teu sorriso, de se poder perder nos teus olhos e de os fazer brilhar. Lotaria de milhões, o poder ter-te a deitares-te sobre ela.
É... definitavamente, invejo a tua praia. As visitas que lhe fazes, a sensação que te faz sentir, a vontade que tens de a ver, e o poder tocar-te tanto mais que eu. Definitivamente, emulo-a . No entanto, como posso criticar se faria o mesmo à mesma oportunidade? Se te deixaria perderes-te em mim ao primeiro resquício da tua vontade de o fazeres?
Tenho a certeza que esta inveja me faria ladra: roubaria a sorte dessa tua praia sem pestanejar. Não tenho dúvidas de que esta inveja me transformaria em bruxa: aprenderia todos os truques necessários para quebrar essa maldição que ela te lançou - ou todos os feitiços para que essa sorte fosse minha. Não hesitaria, convictamente, em trocar de lugar com ela e te beijar de cima abaixo, abraçar-te e enroscar-me em ti - seria , prontamente, um desses grãos de areia que levas para casa.
No entanto, trocaria a sorte desse sítio, por ser eu a tua sorte. Ser a tua sorte para nos perdermos juntos nesse por de mar, nessas nuvens de espuma, nessas ondas de sol... nessa tua praia invejável.
Eu sabia que provavelmente seria tudo desse teu sorriso (malandro) para fora. Tinha toda a certeza do mundo de que não podia confiar, quando tudo em ti parecia ser a ilusão personificada.
Mas tu quiseste agendar um crime. Deixaste propositadamente escapar, sem culpa, onde e quando. Fizeste-me querer marcar presença num momento ilícito. E nós não o verbalizámos de forma evidente...isso seria demasiado óbvio - e haveria provas. Mas ficou marcado com local, data e hora - com culpa, clandestinidade e vontade.
Era um encontro secreto, amanhã, com vista-mar.
E eu fui , sem saber o que queria , mas a saber - tão bem - o que esperar. E cheguei atrasada para a hora marcada comigo mesma, bem a tempo de ti, com a postura de quem não quer só chegar, mas ficar também. Cheguei cheia de noção do que poderia acontecer, fazendo força para que não acontecesse e fingindo não saber de nada. Cheguei cheia de mim, comigo mesma. Cheguei onde tinhas dito que estarias.
Tu sabias que eu viria, e eu sabia onde te encontrar. Era tão mais fácil se não soubesse onde te encontrar.
Era um encontro clandestino, hoje, com vista-mar.
E... não sei se foi da paisagem (tu não tinhas como saber, mas o horizonte azulado sempre me deixou vulnerável), se foi do cheiro (tu não tinhas como saber, mas a maresia deixa-me demasiado livre), ou da sensação térmica (tu não tinhas como saber, mas o ar quente salgado tolda-me a consciência), mas perdi-me ao me cruzar contigo de novo quando, previsivelmente, descaradamente e finalmente, decidiste dar o ar da tua graça - ou da minha desfortuna.
Era tão mais fácil se não tivesses vindo.
Parte de mim queria muito que não viesses - nunca haveria delito, não haveria vítimas, nem se consumariam beijos que deveriam ser impróprios para consumo, nem haveria balas perdidas, demais transgressões ou eventuais e inevitáveis regressos ao local do crime. Mas a outra... ai a outra parte! A parte que ficou desolada com o não te encontrar logo e com o teu (ligeiríssimo) atraso ao nosso encontro não combinado, a parte que ficou impaciente com a tua ausência, a outra parte que queria, desesperadamente, que não tivesses tardado, que viesses sem passado, que viesses desarmado.
Era tão mais fácil se viesses desarmado.
Mas tu não só vieste armado, como trouxeste toda uma artilharia pesada que eu já conhecia - e que mexeu comigo desde a primeira vez. E eu apresentei-me negligente - sem desculpas, sem culpa, sem armas - perante todo o teu arsenal. Eu numa inocência bélica, tu numa aura clandestina.
E fugiu tudo.
Fugi de mim.
Rendi-me!
Perdi-me:
Perdi-me de mim.
Mas tu não me perdeste e eu encontrei-te e não me devia ter encontrado também. Mas encontrei-nos aos dois, numa conjugação que só deveria existir no singular. Encontrei-nos num crime que provavelvemente nunca prescreveria. Encontrei-nos em tudo o que não devia ser mexido, em tudo o que deveria ser evitado, em tudo o que eu bem sabia ser ilegal, em tudo o que não sabia e que sabia bem de mais, em tudo o que (me) saberia bem de mais, em tudo o que bem me soube. E bem me quis. E a pouco me soube. Soubemos, sabemos, saboreámos, somos, fizemos, fomos, foste, fui. Fugi de ti.
O relógio da igreja dava as onze badaladas previsíveis, mas que rezava por não ouvir. O sino bateu pesado como de costume, e insistente em fazer-se escutar. Gritou comigo o passar do tempo e eu fechei os olhos e concentrei-me no som que ecoava dentro da minha cabeça. Concentrei-me num "aparece" que teimava em não se representar. Devia saber: devia saber que tardarias a chegar ou que, como sempre, não virias de todo. Mas eu, como sempre, queria-te esperar. Eu, como sempre, iria esperar-te e esperar a desilusão que a tua ausência, inevitavelmente, iria trazer.
Parei, na minha varanda de onde tantas vezes te vi chegar, e virei o meu olhar para uma torre de igreja que tantas vezes admirei e que hoje parecia disforme, assustadora, tão cheia de si, tão pintada de realidade.
Voltei a repetir silenciosamente um "aparece" , como quem se perdeu num mísero toque de sino, sem se quer perceber que aquelas onze não se repetirão. Quantas delas já teriam passado? Quantas badaladas, quantas horas, talvez quantas oportunidades, teriam passado? Perdi-me num eco tão inexistente como a tua presença, num toque que me tocava a alma agora tanto quanto tu havias tocado, num som tão áspero como o silêncio da tua não-chegada.
E o relógio da igreja continuava a tocar, numas badaladas épicas de vontade e desejo, num sforzando incessável, num contar de horas que parecia marcar muito mais do que o impacto de doze badaladas, quando ainda faltava uma hora para elas. Ou ter-me-ia eu perdido no meio de um tempo indiscreto e volátil? Teria eu descrito uma torre de igreja enquanto esperava a tua vinda, que demorava agora uma hora a mais?
Olhei para o velho relógio na parede da cozinha, com vontade que este momento analógico me trouxesse à terra, me chamasse à razão, me beijasse de realidade, como eu queria que tu fizesses: beijarias-me de realidade, e despirias-me a razão. Deixavas-me abraçar as nossas analogias, deixavas-me embriagar-me de ti, afogar-me nas tuas recompensas pelas falhas que se sucediam, deixavas-me enlaçar os meus dedos nas metáforas que tanto desperdiçava contigo.
Desperdiçar - o termo que se adequaria à cena que estava a fazer há precisamente pouco menos de nada e que já parecia tanto... talvez porque também tu me desperdiçavas, me desgastavas, me deixavas passar, me deixavas ir como o tempo ia agora comigo. Talvez porque eu me desperdiçava. Talvez porque eu desperdiçava o meu tempo à espera de um retorno que nunca chegaria.
E eu ouvia a torre da igreja com umas baladas que teimavam em não acabar, concentrava-me num "aparece" impossível, olhava da torre para a estrada e da estrada para a torre, na esperança de te encontrar perdido entre um alcatrão que se confundia com o escuro da noite. E tu estavas atrasado. Demasiado atrasado. Tardavas demasiado.
Tardavas, mas não falhavas.
Apareceste. Finalmente, apareceste.
E eu dali, a ver-te chegar, sabia que te receberia e desculpava, contra qualquer compromisso comigo mesma, contra qualquer ideologia ou conselho, contra qualquer réstia de orgulho, contra qualquer despeito: ceder-te era o meu maior defeito e a minha maior qualidade.
Ver-te era como um recarregar de baterias, um encher de um depósito, o saldar de uma dívida. A ampulheta do desastre foi virada, o cronómetro do desespero foi zerado. Eu, dali, a ver-te chegar, sabia que tardarias novamente e me vestirias de incerteza numas novas badaladas, numa nova lua, num mesmo contexto e num não tão diferente enredo... e tudo se tornaria a repetir: a tolerância, a paciência, a expectativa, a esperança, o nosso desperdício, o teu prazer em me desesperares, o meu descuido em te aceitar, o beber das tuas desculpas e o embebedar-me do teu todo.
Desta vez tardaste, mas não falhaste.
Numa outra vez, não tardarias em falhar. E eu, a ver-te chegar assim, sabia que te cederia novamente, eventualmente, certamente, descaradamente... desesperadamente.
What if after the sunset you're not here anymore? What if you're gone with the last daylight? What if I can't find you in the darkness of the night?
Go!
Because I can afford to lose you on the beach... and, truth to be told, is there a better place to wait for a new day? Is there a better place to absorb my own company? Is there a better place to start over?
I'll enjoy me. I don't get sick of being lonely, I am pleased to be on my own. I will smile to me, I hold me tight - yes, not with you, but with me. And, like this, I won't lose you anymore. You'll go, I'll stay. Tomorrow I already found myself and I will glow either with the sun as with the moon. And I'll stay there until late night. I will enjoy me in my beloved sunset light, that exists with or without you - and that I have as much as I need. Tomorrow I won't lose you, although I never thought I have you, and we can't lose what we never had.
Go!
I can guide myself in the darkest nights, as good as I can during day, for a long time now.
And, if you disappear in the sea as the sun, you'll go in a pretty way.
Há já muito tempo que me sei guiar tão bem no escuro da noite como em plena luz do dia ...
Go! Because I won't, I don't want to go, and I didn't disappear. I was here, I am and I will be (for the sunset, for me, and, if needed, even for you).
E se depois do pôr do sol já não estiveres? Se te fores embora com a última luz do dia? Se não te encontrar no escuro da noite?
Vai ! Porque a praia é um bom sítio para te perder... e , na verdade , há lá sítio melhor para esperar por um novo dia? Há lá sítio melhor para respirar a minha companhia? Há lá sítio melhor para recomeços?
Aproveito - me de mim. A solidão não me cansa , a minha companhia agrada-me. Sorrio-me e abraço-me - verdade que é sem ti, mas é comigo. E, assim, amanhã já não te perco. Tu vais e eu fico. Amanhã já me encontrei e brilho à luz do sol ou da lua. E ficarei ali até à noite. Aproveito - me naquela luz de fim de dia que existe contigo, ou sem ti e que lá está sempre que preciso. Amanhã já não te perco, apesar de nunca ter pensado ter - te e de não se poder perder o que nunca se teve .
Vai!
Há já muito tempo que me sei guiar tão bem no escuro da noite como em plena luz do dia ...
E, se desapareceres no mar como o sol, desapareces bonito.
Vai ! Porque eu não vou, não quero ir, nem desapareci . Estive , estou e estarei lá ( para o pôr do sol , para mim e , se for o caso , até para ti ).